10 Questões a Miguel Saraiva

Miguel Saraiva é socio fundador do atelier Saraiva + Associados, uma referência no panorama da arquitetura nacional mas também um caso de sucesso de internacionalização.

O atelier assinalou recentemente 25 anos, contando com uma equipa de mais de 120 arquitetos, com atuação em diversos países da Europa, América, África e Ásia.

Miguel Saraiva foi vice-presidente da Secção Regional Sul da Ordem dos Arquitetos, no triénio 1999-2001.

Entre outros Prémios e Menções Honrosas no âmbito da Arquitetura, recebeu diversos Prémios de Melhor Atelier de Arquitetura, Prémio de Personalidade do Ano em Arquitetura e Prémio Distinção Carreira

1.º Projeto
O primeiro projeto de relevo foi uma moradia
na Régua – “Casa da Régua”, para o cliente
Francisco Lopes.

Projeto Mais Desafiante

É difícil destacar um Projeto. Um dos projetos que mais me desafiou emocionalmente e tecnicamente foi a Infinity, a torre que está a ser construída na Av. José Malhoa, em Lisboa, isto porque é uma zona de transição com um conjunto de vias, nomeadamente o Eixo NorteSul e a linha de comboio, ladeado por uma série de vias secundarias . Com 26 pisos, constituiu um enorme desafio fazer uma peça diferenciadora e que tivesse um caráter de verticalidade, com o desenho de um trevo de três folhas.

Arquiteto de Referência

Seria deselegante destacar um nome, pois tenho tido várias referências no decurso da minha experiência profissional. O processo criativo decorre da curiosidade e da constante atenção ao mundo, da viagem interior que é a vida, da experiência e do conhecimento que vou adquirindo em múltiplos contextos. Os arquitetos de referência são os que trabalham diariamente comigo!

A pandemia alterou hábitos de trabalho com especial impacto na forma como vivemos as nossas casas. A casa passou a ser central, em termos de arquitetura já sentiu este impacto/mudança?

Sem dúvida! A pandemia mudou os hábitos de trabalho e a
forma como vivemos as nossas casas, a todos os níveis. As pessoas estão a ser mais exigentes, pelo que hoje os espaços têm que ser mais humanizados, ou seja, mais confortáveis.Para isso, os espaços têm que ser mais arejados, e isso implica menos gente por m2. A varanda, por exemplo, constitui hoje em dia um elemento diferenciador, e será cada vez mais relevante a existência de varandas com maiores dimensões.
A pandemia veio também aumentar o nível de exigência da casa, e isso é muito positivo, porque aproxima o nível de exigência do comprador ao daquele que a vende. Quem compra quer mais espaço e conforto, também decorrente do facto de termos começado a trazer para dentro de casa uma série de funcionalidades que antigamente não dispúnhamos.

As cidades também têm vindo a sofrer grandes alterações, nomeadamente no que respeita à mobilidade urbana. Era impensável, há 10 anos atras, andar de bicicleta em Lisboa pela configuração da cidade. Hoje Lisboa tem ciclovias e meios de transporte totalmente sustentáveis. Esta alteração no espaço público tem também impacto na arquitetura dos edifícios?

Com certeza que sim. A sustentabilidade não é uma moda, nem uma tendência; é um novo paradigma. É uma nova forma de estarmos no mundo, de vivermos as cidades e de nos comportarmos com responsabilidade. A arquitetura tem uma responsabilidade preponderante na integração do conceito na obra. Outros setores, incluindo o setor público, têm também um papel determinante na materialização desta responsabilidade.

Novos hábitos, mais amigos do ambiente, estão também na ordem do dia. A sustentabilidade passou a fazer parte da nossa realidade. Há hoje novas soluções de construção e de eficiência energética, mas também maior consciência na utilização de materiais. Estas novas soluções encarecem os projetos ou já são, efetivamente, integrante dos mesmos?

A sustentabilidade não é apenas uma parte do ambiente; é o próprio ambiente. E, partindo desta premissa, a sustentabilidade torna-se numa espécie de trave-mestra dos nossos projetos, que depois tem reflexos diferentes nas suas diferentes fases. Mas não podemos deixar de referir que os princípios base já estavam consagrados na nossa forma de desenhar: a orientação solar, as casas de dupla exposição, etc. Hoje vamos atingindo outros níveis de garantias, que passam, por exemplo, na escolha dos materiais, que têm de seguir padrões específicos para serem certificados, que é o primeiro grande passo na construção de um edifício sustentável, soluções técnicas passivas e ativas, que impactam por exemplo no conforto acústico e térmico, entre outros aspetos, que vão até à fase de manutenção. E assim sucessivamente, vamos criando cidades sustentáveis, edifício a edifício. Se as boas práticas de sustentabilidade forem garantidas, a valorização dos Ativos será uma realidade, e essa valorização é compensada face ao valor do investimento inicial em diferentes níveis.

E os promotores já integraram esta mudança de hábitos?

Os Promotores têm necessariamente de acompanhar a mudança de hábitos, e isso está a ocorrer lentamente. A exigência hoje, em todo o sector da construção, é enorme, e tem grandes impactos na economia, derivado da opinião pública, dos compromissos dos projetistas, da qualidade das fiscalizações e da excelência obrigatória das construtoras. Quem não apanhar o comboio da sustentabilidade ficará parado no tempo.

A arquitetura é o reflexo da cultural e de hábitos locais. Nos últimos anos, Portugal tem atraído o interesse de clientes internacionais com hábitos próprios e culturas diferentes da nossa. Este
interesse por Portugal teve algum reflexo nos projetos que fez nos últimos anos?

Sem dúvida que os hábitos próprios e culturas dos Clientes internacionais têm reflexo nos Projetos que desenvolvemos. A arquitetura só tem interesse se responder a necessidades. A arquitetura, respondendo a programas, existe para ser habitada e vivida. Nós arquitetos, o que queremos é desenhar para construir, construir e servir. Tenho um elevado sentido de compromisso com aqueles que confiam no meu trabalho e no meu atelier. Acredito que é fator de sucesso e de desenvolvimento da forma como estou nesta disciplina tão vasta, dado o modo como esta atravessa a vida das pessoas e determina a qualidade das cidades e de todos os territórios. Levo muito a sério os compromissos que assumimos com os nossos clientes, não só no que se refere à qualidade da proposta em termos estéticos e técnicos, como também no cumprimento de prazos e das etapas dos programas. Além disso, bebo muito da realidade que nos rodeia. Leio constantemente as dinâmicas de mudança da nossa sociedade, impostas por alterações urgentes e pelo surgimento de novos paradigmas como, por exemplo, os que decorrem da emergência ambiental, da gestão de recursos, da atenção cada vez maior à qualidade de vida nas cidades através de um urbanismo mais rigoroso quanto à construção e aos espaços públicos. Só com esta atenção, pesquisa e informação é que conseguimos antecipar tendências e criar soluções inovadoras.

Qual a sua visão da cidade do futuro?

O desafio passa por incluir na transformação da cidade as premissas da economia circular:

• Programar e investir em novos modelos de mobilidade, que permitam que a cidade funcione sem congestionamentos e evitar desperdícios energéticos ou emissões desnecessárias;

• Desenvolver estratégias integradas para a redução dos nossos consumos e das nossas emissões nas nossas atividades;

• Ter edifícios mais saudáveis e mais eficientes, espaços públicos e equipamentos de maior qualidade urbana, que fomentem a interação social.

O que precisamos é de estilos de vidas saudáveis. Uma
Cidade só chegará a um patamar de espaço saudável e
sustentável se estiver à altura das necessidades económicas,
sociais e psicológicas da população.

A Arquitetura é arte ou serviço?
Talvez ambos! A Arquitetura refere-se à arte e técnica de projetar o ambiente habitado pelo ser humano. É um processo de criação de espaço construído, suporte físico de todas as atividades humanas e por isso, numa perspetiva de mudanças, é um instrumento indutor de transformações sociais e ambientais, de forma a MELHORAR A QUALIDADE DE VIDA DO HABITAT E DAS CIDADES.

 

 

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